quinta-feira, 14 de maio de 2009


A Invasora

Havia todo um movimento querendo identificá-la. Pouco se sabia sobre ela, somente que entrava e saia dos países, sem preocupação com vistos ou outros documentos. Deixara pequenos rastros pela América do Sul, igualmente na América do Norte, e até na sisuda Inglaterra suspeitava-se que estivera.

Não se tinha informação de que causara qualquer dano ou tivesse cometido uma ação violenta, apenas causava espanto a falta de registros concretos da sua entrada ou saída.
Os poucos que, por trabalharem nas alfândegas e fronteiras, tiveram a oportunidade de vê-la, desconversavam quando perguntados pelos aspectos legais e formais da passagem da Invasora; simplesmente se recusavam a comentar as circunstâncias de como ela entrara ou saíra daqueles países.

A coisa foi tomando tal vulto que os organismos internacionais reuniram-se para uma investigação abrangente e sigilosa. Sim, sigilosa, porque ao mesmo tempo em que a transgressão de normais legais e diplomáticas incomodava, não havia registro, como relatado, de qualquer tipo de dano ou prejuízo.

A surpresa surgiu quando um dos interrogados, submetido a um detector de mentiras respondeu “SIM” à pergunta: “Ela portava alguma arma?”.

Da para imaginar o que ocorreu a partir daí. Por todo o mundo buscava-se a solução para o enigma.
Quem era ela?
Quais os seus objetivos?
Que terrível arma usava ao ponto de as testemunhas recusarem-se a denunciá-la?
Pela primeira vez na história as potências mundiais reuniram-se e instauraram um processo único, de âmbito mundial contra ela. Não haveria trégua até a captura da Invasora.
Os procedimentos nas fronteiras e nos aeroportos ficaram mais rígidos. Levavam-se horas para embarques e desembarques. O desconforto tomou conta do mundo.

Foi então que a Invasora, constatando, pelos jornais, todo o problema que estava causando, anunciou que se entregaria. O Chefe Maior das potências regozijou-se e anunciou que a pena seria a mais severa possível. O processo iria até o fim e não haveria qualquer possibilidade de perdão.

O encontro da Invasora com o Chefe Maior, por receio de impensáveis conseqüências, foi cercado do maior sigilo e cuidado. Será que ela levaria sua arma? Que mal poderia fazer em um último momento de desespero?

O Chefe Maior, transformado de repente em herói da humanidade, não se intimidava e não baixava o tom. Encontrar-se-ia com ela sozinho, não importava que arma pudesse ela portar. Prende-la era sua missão.

Marcado o encontro, todos os meios de comunicação aguardavam o desfecho, ansiando pelo anúncio da prisão da Invasora.

A reunião da Invasora com o Chefe Maior não durou muito tempo. Ao término, o Chefe Maior permaneceu na sala redigindo, um tanto constrangido, um discurso para a imprensa, que aos empurrões aguardava a solução da questão.

Ao mesmo tempo a Invasora calmamente saía por uma porta lateral, portando um sorriso que desconcertara o Chefe Maior; o mesmo sorriso – arma poderosa - que lhe abrira as portas, fronteiras e controles de todo o mundo.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

MENSAGENS EM GARRAFAS


Desde pequeno sinto atração por histórias de náufragos que, após nadar para ilhas desertas em busca de salvação, de lá mandavam mensagens em garrafas, na esperança de um dia serem resgatados.
Mais tarde tomei conhecimento de que, desde a antiguidade, cientistas jogavam garrafas ao mar com mensagens identificando o ponto de partida, na esperança de que uma vez resgatadas, essas garrafas revelassem o caminho das correntes marítimas.
Vemos que em ambos os casos a ESPERANÇA e a busca por RESPOSTAS alimentavam os desejos dessas pessoas; era como lutar com o imponderável, o insabido, em uma escuridão de luz.
Hoje, alguns manuscritos jogados ao mar da vida, há mais de cinqüenta anos, aportaram em minhas mãos.
Na leitura dessas mensagens não encontro uma busca por salvação, tão pouco pistas sobre novos caminhos ou rotas. O que sinto é que delas esvaem dolorosas verdades e vivências muito fortes; brotam gritos prisioneiros de um coração solitário.
Não há como mandar resgate ou mesmo definir uma rota.
Leio, releio, analiso e concluo que as mensagens são para.........ninguém.
Não sei o que fazer com elas.
Mas como ignorá-las se sei quem as escreveu?
O que fazer com os gritos surdos que ainda ecoam em minha cabeça após a leitura?
Como responder a perguntas lançadas dentro de um contexto que desconheço?
Melhor não tentar responder a essas perguntas.
Melhor incorporar essas mensagens ao meu eu.
Melhor misturar tudo como uma energia que impregne meu corpo.
Melhor deixar que assim repouse dentro de mim.
Melhor que siga em frente, sem reservas, sem controle, sem censura, como se fosse parte do DNA.
Afinal, são mensagens de meu pai.

Para José Vieira


Sergio Rocha